Sfumato: Enfrente a sombra

A luz e a sombra são duas presenças constantes que acompanham o ser humano desde os primórdios da história. Muitos filósofos buscaram compreender a relação destas duas polaridades.

Plotino, filósofo neoplatônico, defendia que o bem e o mal são complementares, que um começava onde o outro acabava, e que não existiam sombras, mas sim a ausência de luz.

Os princípios de sombra e luz sempre estiveram muito ligados à consciência humana, pois quando o homem age de acordo com o dever, de forma consciente, ele age na luz. Carl Jung, psiquiatra suíço, dizia: “a sombra é inconsciente“. Krishna, em um trecho do tratado hindu Bhagavad Gita, instruía a Arjuna: “O conhecedor da verdade não permite a sombra do ganho pessoal atacar o caminho do dever“. E falando de dever, defendia Immanuel Kant, filósofo alemão: “O ser humano deve agir pelo dever e não pela inclinação”. Reunindo estes conceitos, temos que a sombra só se torna presente no ser humano, quando ele deixa de agir conforme o dever, o que o distancia de sua própria natureza.

Sfumato foi uma técnica desenvolvida por Leonardo Da Vinci, em que ele conseguia reproduzir com fidelidade a textura da pele humana, através de uma série de camadas de tinta que davam um efeito de esfumaçado. O mestre se aprofundava tanto no estudo de cada obra que entrava em comunhão com a natureza do objeto em estudo. Era quase um processo de decantação onde ele removia todas as impurezas de intenção para deixar passar somente a mais pura e bela manifestação da ideia. Talvez isso explique o profundo mistério que guarda cada obra sua. Como disse Plotino, antes de morrer: “Conjugai o que há de divino em vós, com o que há de divino no universo“. Talvez tenha sido essa a chave de Da Vinci para alcançar profundo conhecimento em cada coisa, e trazer luz à tudo aquilo que ele fazia. O princípio do Sfumato significa trazer luz à nossa consciência através da excelência de cada uma de nossas ações.

Na imagem deste post¹ temos a representação de São João Batista, atualmente no Museu de Louvre, onde o mestre retrata a imagem emergindo das sombras em direção à luz. O movimento da mão de São João aos céus remete ao princípio divino das coisas, mesmo estando estabelecidas no plano da dualidade. É a batalha do homem em relação às suas sombras sem que este esqueça da sua proveniência divina.

Para quem quiser saber mais sobre a história de São João Batista, pode assistir a esta bela exposição do Padre Felipe Aquino:

“A sombra é a diminuição da luz.”

Leonardo Da Vinci
Anotações de manuscritos

1 São João Batista
1513-16 – Oil on panel, 69 x 57 cm
Leonardo Da Vinci
Musée du Louvre, Paris

* Podcast deste post foi gerado com o Notebook LM.

Mais publicações

Dimostrazione: Aprenda com a experiência

Os métodos convencionais de educação já não atendem às necessidades atuais dos alunos. Uma nova metodologia de ensino conhecida como…

Os Quatro Poderes da Natureza

Em seu livro de mecânica teórica, Leonardo Da Vinci reúne conceitos utilizados em centenas de projetos de máquinas como pontes…

Ciência das Formas Vivas

“A natureza é tão abundante em suas variações que, entre árvores da mesma espécie, não seria encontrada uma que se…

Deixe seu comentário

Inscrever-se
Notify of
guest

1 Comentário
Oldest
Newest Most Voted
Inline Feedbacks
View all comments
trackback

[…] sua escrita sempre vislumbraria nas coisas, das mais comuns às mais insondáveis, esse jogo de sfumato, no qual real e imaginário não possuem distinções rígidas, não são versos […]

1
0
Adoraria ouvir sua opinião, participe!x
()
x